Contos de Todas as Horas - Clara Picão Fernandes
7:37 da tarde
Sinopse:
Num tempo de escrita lapidar, do abuso de vulgaridades no diálogo, Contos de Todas as Horas reconduzem o leitor à estética do léxico e da semântica.
A leveza grácil da sua escrita leva o leitor a perder-se nas horas devorando as palavras diferindo as ideias...
Opinião:
Comprei o livro porque, como descrevi aqui, acho que não lemos autores portugueses tantas vezes quanto devemos e também porque gosto tanto de Romances longos como de Contos (de qualquer dimensão). Então, quando comprei alguns livros de contos, adicionei este ao carrinho. A sinopse não nos dá a conhecer muito sobre do que se tratam os contos e às vezes somos surpreendidos pela positiva por estes pequenos mistérios.
Cada conto é introduzido por uma gravura de Francisco Maria Nunes Picciochi de Salter Cid e cada um deles é dedicado a uma pessoa diferente. São histórias pequenas, contam com três, quatro páginas no máximo. São 35 contos ao longo de 175 páginas.
Como sempre, não leio livros de contos de enfiada, como faço com Romances, porque cada história deve ser digerida a seu tempo e foi o que fiz com Contos de Todas as Horas.
O primeiro conto aguçou-me a leitura. Ponto, Linha, Traço... é dedicado ao pai da autora e serve como introdução ao livro. Gostei muito da escrita cuidada e até poética da narrativa. Fiquei ainda mais curiosa. Por exemplo, achei a ideia do conto A Antecipação muito engraçada e bem conseguida, mas não houve mais nenhum que lesse com entusiasmo e isso entristeceu-me.
De vez em quando o ponto faz-se linha dentro das suas entranhas, trespassa-lhe o pensamento, morde-lhe a sensibilidade e vem cá para fora através do lápis ou pincel. De repente, não mais que de repente, é ponte, é comunicação.
À medida que fui avançando na leitura, no entanto, fui-me sentindo cada vez mais longe das personagens e histórias contadas. Se a escrita de Clara Picão Fernandes é cuidada e até bonita como descrita na sinopse do livro, não me consegui identificar com as personagens criadas nem com as histórias relatadas. A maioria das histórias falam de Princesas, Embaixadores, Artistas, Majores, Médicos e Arquitectos que se movem num meio e numa sociedade que não é de todo a minha: festas onde os há "garçons" que abrem cigarreiras com diferentes marcas de cigarros, onde os amigos pintam as esposas dos amigos para lhes oferecerem quadros como presentes e onde os Doutores compram colares de pérolas falsas pelo valor de cinco salários mínimos - não partilhamos da mesma realidade. O caso mais flagrante tratou-se de um conto sobre uma menina, aniversariante de seis anos, que a mãe trata por você. E desde aí reparei que mesmo num caso de dois amigos em que há um crescente amor platónico, o mesmo acontece, assim como jovens noivos. Gosto de acreditar que recebi uma boa educação e, apesar dos meus pais tratarem os pais deles por você, tal nunca aconteceu entre mim e os meus pais ou entre mim e os meus avós.
A estrutura do Futuro é sempre feita no Passado.
Achei infeliz um conto em que a empregada de confiança de um casal abastado é retratada como, ao encontrar um percalço na vida em que precisa de dinheiro, a primeira coisa que lhe ocorre é roubar uma jóia da patroa. A situação nem era desesperante ao ponto de fazer a senhora tomar tal atitude. Ao longo dos contos, por vezes parece haver uma necessidade de rebaixar aqueles que vêm de uma classe inferior aos Majores, Príncipes e "primos" da classe alta. Há uma grande vontade em demonstrar que a nobreza vem do sangue e não da maneira de ser.
A humanidade nem sequer vai ter tempo de criar anti-corpos antes do desaire. As pessoas não vivem numa sociedade de conforto, mas numa sociedade puramente consumista, de desperdício.
Houve ainda um conto que me deixou desconfortável porque a autora insistiu na utilização do termo África Negra numa crónica sobre uma breve aterragem em avião privado que fez pela Mauritânia que, mesmo para 2001 que foi o ano em que o livro foi publicado, pareceu-me impróprio.
O livro é escrito em Português com algumas frases em Inglês, Espanhol e Alemão (não muitas), mas que não estão traduzidas e para quem não sabe nenhuma destas línguas, pode ser chato. O último conto é totalmente em inglês, dado que a autora é professora de inglês.
A maioria dos contos estão ligados à Causa Real não fossem eles sobre lendas e histórias relacionadas com vários membros da Família Real Portuguesa ao longo dos séculos: Dom Afonso Henriques, Dom Dinis e Isabel de Aragão, Pedro e Inês, A Infanta Beatriz, entre outros. Daí que estou certa de que existe público para estes contos, mas não me revejo como parte do mesmo.
5 comentários
Não conheço a autora.
ResponderEliminarBoa oportunidade para ficar a conhecer.
Grato pela resenha. Não conhecia o livro até então.
ResponderEliminarBom fim de semana!
OBS.: O JOVEM JORNALISTA está em quarentena de 22 de julho à 31 de agosto, mas comentarei nos blogs amigos nesse período. Mesmo em quarentena o blog tem dois posts novos. Não deixe de conferir!
Jovem Jornalista
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Até mais, Emerson Garcia
Desconhecia a autora e o livro em questão e se, no início da tua crítica, até achei que o iria adicionar à lista, termino com a sensação de que também não será um livro para mim
ResponderEliminarA opinião com que ficamos de um livro também depende do nosso estado de espírito...
ResponderEliminarNão conheço nada da autora. E fiquei curioso.
Bom fim de semana.
Beijo.
A sua opinião é muito interessante. Não conheço a autora, mas gosto muito de contos. Obrigada.
ResponderEliminarUma boa semana com muita saúde.
Um beijo.